maio 15, 2012

Portugalidades

O Portugal que tenho guardado é um que já mal se vê e que vai sobrevivendo apenas nas aldeias.
É o Portugal das mercearias, das barbearias e dos cabeleireiros nas traseiras duma casa, dos mercados semanais... o Portugal do Campino, do Forcado, do Pescador, da Varina e do Fado e da Fadista.
Nesse Portugal não se trancam portas e pede-se uma chávena de açúcar à vizinha, que se lhe paga com meia dúzia de ovos da nossa galinha poedeira, a contra vontade da dita vizinha que nada queria em troca.
Muitos lhe chamariam um Portugal provinciano, eu chamo-lhe um Portugal de Simplicidade.
Mas não é esse o Portugal destes dias.
Vive-se tão embrenhado no contra-relógio de se querer ser um país de primeira linha e no jogo de cintura dum país em cacos que não se olha para o lado, não se ajuda ninguém, não se sabe o nome da vizinha, por isso se não há açúcar bebe-se chá amargo e mata-se o meu Portugal Simples...
Também numa correria vinham duas cachopas, para tentar apanhar o autocarro, carregadas de compras. O motorista lá as vê e encosta na paragem. Quando uma delas dá conta que não tem dinheiro para o autocarro e a outra apenas tem para ela.
[Modernice de multibanco faz com que não andemos com dinheiro no bolso, hmpf !]
Então ela diz ao motorista que por favor a deixe ir, porque na paragem de chegada lhe dará o dinheiro. Ele deixa.
Ligam à colega de casa para que esteja na paragem com a moedinha que paga a viagem.
Não precisavam, porque discretamente um Senhor se chega perto delas e pousa uma pequena moeda no colo da cachopa, com um olhar complacente.
Estupefacta, a cachopa diz-lhe que não é preciso, que a colega estará à espera, ele recusa a moedinha de volta.
À saída põe-a no bolso do senhor com um "Obrigado" e a colega lá paga o autocarro...

E a cachopa, eu, tive a certeza que ainda se pode pedir chávenas de açúcar.

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Créditos:
Música: Amália Rodrigues - Uma Casa Portuguesa