julho 02, 2009

A queda dos gigantes

Vou escrever em honra deles, dos dois enormes gigantes que me guardam a casa, os risos, sonhos e memórias da infância.
Lá ao fundo, do outro lado da estrada, onde as árvores não estão em agonia, um tractor lavra a terra seguido por uma parada de garças, graciosamente brancas, que aumenta a cada aterragem.
O primeiro dia de Primavera é celebrado por este solzinho quente, contemplo-as, tão serenas face à morte. Os meus dois gigantes, ajudados pela brisa, ondulam os seus enormes braços, saudando-me. Estão fracos, debilitados. Estes braços que agora me saúdam, velhos, acastanhados, mas ainda assim enormes e acolhedores, não são os mesmos verdes e frondosos de outras primaveras. As minhas pinheiras, os meus gigantes, estão doentes.
Eles eram dois apenas, elas aos montes, tão numerosas quanto as pragas do Egipto, impiedosas e implacáveis. As lagartas fizeram filas e treparam-nas, violaram os seus troncos, santuários da minha infância. No lugar das pinhas, os ramos, que me ampararam tantas subidas, que ainda seguram os sonhos e risos ingénuas da criança que fui, estão minados com esféricas colónias de parasitas. Estão tão tristes, tão murchas, as minhas amigas. O verde esmoreceu a olhos vistos, as agulhas caíram por terra em massa, e elas batem-se digna e honrosamente pela vida. É como David a lutar contra Golias, só que, desta vez, David são aquelas lagartas sedentas de seiva e eu anseio que “os meus pacíficos Golias” saíam vitoriosos.
Hoje, vim visitá-los, mais esperançosos depois das últimas chuvas. Estou no meu banco, eles contam-me como sentem a vida voltar a povoá-los a cada fervorosa golada de seiva bruta que as suas raízes bombeiam da terra. Ganharam, continuam serenos, não se vangloriam, continuam sim de braços erguidos, saudando o céu e, também, a mim. Não querem falar de si, em vezes disso querem ouvir-me, consolar-me, sarar-me, com o som perfumado da meninice, as feridas que me amargam, por vezes, o sorriso.
Os meus dois gigantes ainda estão de pé, lutando pela vida. E é assim que também querem que eu esteja...




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