outubro 18, 2009

Caída

Quase sem olhar corta a mecha de cabelo que tem na mão, fá-lo uma e outra vez, fá-lo repetidas vezes. Fá-lo.
Um rasto de cabelos vem desde a casa de banho até perto da cama, onde acaba perto duma tesoura cansada.
Cabelo agora curto, desgrenhado, ela está caída sobre o colchão, vencida pelo cansaço adensado pelas lágrimas.
Chorou pelo cabelo que, numa acesso louco, cortou e pelo cansaço que brigava com as suas pálpebras.
Estúpido cabelo que enfraqueceu com ela por culpa de se entregar inconsequentemente.
Estúpido cabelo de menina ingénua, de criança luminosa, que não bate certo com o soturno farrapo errante que é neste cansado momento.
Arrastou-se descaracterizada até à cama, arrastou-se na esperança dum abraço e apenas deu com o colchão vazio.
Acorda e enfrenta a evidência do colchão vazio.
Agarra o cabelo.
Suspira d'alívio.
Comprido e encaracolado como sempre.
Ela entra e sorri-lhe.
Ela está lá, como sempre. Vai para perto dela, abraça-a.
Ele entra, bandeja com pequeno-almoço.
Olha-a complascente.
Beija-a na testa.
A febre passou...

Borrega

Créditos:
imagem: Patti Smith

1 rugidos:

André Sebastião disse...

E não é que isso aconteceu mesmo...
É viciante a tua prosa.

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