junho 29, 2009

encontro

Oriana olhou a imagem que achara na net. Petra seria o nome dela, era exótico, deslumbrante, sedutor e mantinha-se no fio da navalha entre o forte e o terrivelmente frágil.
Voltou a ouvir o eco da conversa dessa manhã, enquanto caminhava com um amigo. “E se ele voltasse a trás e te pedisse para voltar, voltavas?”, perguntara ele. A sua resposta até a ela mesma a surpreendeu, “Não te vou dizer um «Não» peremptório, mas duvido muito que voltasse.”. O amigo sorriu-lhe.
Petra não tinha essa certeza, ou, se a tinha, estava prestes a perdê-la. Estava agora certa da história que aquela imagem tinha para lhe contar. Assim, pegou numa folha, colocou a imagem no ecrã do portátil e começou a escrever:

«O dia nublado parece não lhe agoirar nada de bom. Ela segue pela rua, perdida nos seus pensamentos. Cruza-se com um homem, um que se lhe destacou por entre a multidão amorfa.
Naquele segundo, em que os olhos cinzas se cravaram nos seus, invariavelmente castanhos, a sua mente andou a velocidades astronómicas, tentando perceber o porquê daquela sensação agridoce, quente e desconcertante de reconhecimento.
Era ele!
Passaram. Não queria olhar para trás, mas o seu movimento foi travado. Sentiu uma mão quente a prender a dela, fria, forçando-a a olhar. Então voltou-se, os seus movimentos foram tão lentos que os estranhou, e encarou o homem a medo.
- Petra… - ciciou-lhe enquanto, com a mão livre, lhe erguia o queixo.
Aqueles olhos continuavam desconcertantes, desnudando-a em toda a sua fragilidade. Despertando reacções por cada porção do seu corpo…
- Olá. Há quanto tempo… Tudo bem? Que é feito de ti? – Atirou-lhe de rajada.
“Estava nervosa, mas porquê?”, pensou.
- Petra… - disse com mais convicção.
Puxou-a para uma ruela paralela, sem vivalma. Encostando-a contra a parede, sem nunca lhe largar os olhos.
“Ainda saberia ele que aqueles olhos a gelavam. A prendiam e deixavam à mercê dos desejos dele? Não, ele não se podia lembrar, não depois de tanto tempo. E porque não o contrariava ela? Porque continuavam presa submissa daqueles olhos?”, estes pensamentos assomaram-lhe a mente, frenéticos.
Enquanto isso, ele aproximou os seus lábios dos dela, continuavam carnudos, tão bem delineados. Até o cheiro dela era igual, aquela irresistível fragrância étnica que ele tinha deixado, por nada! Sabia-o agora…
Beijou-a… Encarou-a… Beijaram-se…
Naquela parede, daquela ruela sem vivalma, eles, entre beijos e nomes sussurrados, provaram de novo o calor de se ser as duas partes de um todo… Até que se largaram...
Olharam-se, enlaçaram os dedos e mergulharam na multidão, seguindo sem rumo, até se largarem com um reticente, mas sem qualquer mágoa, “Até à próxima.”…»


Um sorriso leve aflorou-lhe nos lábios. Era esta a história de Petra, era esta a história que aquele beijo tinha para lhe contar…

Oriana…
Borrega




Créditos:
Música: 3 Doors Down - "Kryptonite"
(apenas porque passei toda a tarde a ouvi-la, ou seja, isso incluí enquanto escrevia. ahh e porque venero esta música!)

junho 27, 2009

Colo d'alguém

Oriana tem a cabeça repousada nos joelhos de Alguém que lhe acaricia os cabelos ondulados. Nas mãos tem um bloco de folhas brancas e uma caneta.
Está perdida entre as ruínas dos seus momentos perfeitos, esse Alguém sabe-o, pois os seus olhos estão vazios de presente e turvos de dor.
Oriana mergulhou nesses seus momentos e começa agora a rabiscar sofregamente, desvirginando a alva folha...

"

«Foi o clorofórmio da minha dor, agora é o cianeto da minha vida.»


Ainda dói... tanto...
Apareceste na minha frente, tu e a tua simplicidade, tu e a tua sinceridade, tu e aquela promessa eterna de companheirismo e amor...
Abracei-te o mais forte que pude com os meus pequenos braços e o teu aroma adormeceu a minha dor, a minha raiva, os meus ímpetos narcisistas.
Mas tu não eras imune ao mundo, não eras imune a mim, ao meu veneno de desilusão, então partiste... Deixaste-me largada, já não tinha o teu aroma para adormecer a dor, no lugar dele o aroma da ausência mata-me aos poucos.


"Over and over and over again she cries
Don't fall away, and leave me to myself
Don't fall away, and leave love bleeding
In my hands, in my hands again
Leave love bleeding
In my hands, in my hands"


Oriana"


A mão d'Oriana pousa sobre a mão que lhe afaga os cabelos.
- Chega-me a caixa das cartas, por favor.
Abre-a e coloca lá o que acaba de escrever. Alguém olha-a complacente e pergunta:
- Mais leve?
- Um pouco, mas não pares como os mimos...
E Alguém continuou a afagar os cabelos de Oriana...
Teria ele a noção que ela sentia aqueles mimos na alma? Que eles lhe estancavam, nem que fosse por momentos, a hemorragia?

Oriana...


Borrega


Créditos:
Música: Fuel - "Hemorrhage"

junho 26, 2009

Drama Queen

‘Estou morta’ sussurrou ao telefone.
‘Então vai dormir. Amanhã falamos.’ Responderam-lhe do outro lado.
‘Não. Não estou cansada. Estou mesmo morta.’ Insistiu novamente.
‘Como?’
‘O sangue está a jorrar para todo o lado. Já não sinto as pernas, e daqui a pouco não sei…’
‘Quem te fez isso?’
‘Uns tipos quaisquer. Esfaquearam-me. Liguei para o 112.’
‘Mas como estás tão calma?’
‘O pânico já passou. A morte é inevitável.’
‘Tem esperança. Porque me estás a ligar? Poupa o fôlego…’
‘A esperança só vai depois de mim. O fôlego só desaparece comigo. E tu? Preferias saber que eu morri por um desconhecido?’
‘Não… Mas… Saber que não posso fazer nada para te ajudar… Saber que os paramédicos ainda vão demorar… Saber que não me posso dirigir a ti, agarrar na tua mão enquanto… ’ murmurou para si, ainda não aceitava, mas acreditava cegamente nela. ‘Ligaste-me só para dizer isso?’
‘Não…’
‘Então?’
‘Liguei para saberes aquilo que nunca verbalizei. Liguei para ouvir a tua voz. Para levar isso comigo. E por amor de Deus, não remoas nisto… São só palavras…’
‘Diz-me!’
‘Gosto-te… Muito…’
‘Parva. Eu sei…’
‘Não, não é isso… Não é só gostar, é mais… Mas não sei definir, então assim: eu gosto-te…’
‘É… Eu também.’
‘Obrigado.’
A chamada caiu, assim como a lágrima no canto do olho.
‘Desculpe.’ Abordaram-no.
‘Sim?’ sorriu como mandavam as regras de etiqueta.
‘Já ouviu?’
‘O quê?’
‘Aquele assalto ao laboratório? A poucos quilómetros daqui…’
‘Não… Que roubaram?’
‘Não sei, mas aparentemente há feridos…’
‘Graves?’
‘Ninguém me disse, mas acho que sim… Uma rapariguinha nova… Acho que a barricaram lá… Os paramédicos não conseguem entrar…’



Ele desmanchou-se a rir. Estavam deitados. Ela apoiada no braço dele.
‘Que drama!!’
‘Oh… Não valia a pena sobreviver depois de te ter dito uma barbaridade daquelas!’
, disse-lhe entre sorrisos.
Ele beijou-a. Ficaram frente a frente. Ela olhou-o com um ar inquiridor.
‘Tenho de aproveitar enquanto posso, não é?’
Beijou-a outra vez. Aconchegou-a. Daqui a pouco o momento de lamechice acabaria, e voltavam os dois às gargalhadas e brincadeiras.



Pulga

Cartas a Florbela - epitáfio

Segunda-feira... já te tenho, sei que sabes isso. Fiz questão de te pedir ao balcão, embora soubesse de cor o teu lugar na estante. Ele não tinha a certeza se lá estavas, procurou-te no sistema informático depois esteve, o que a mim pareceu, uma infinidade para te achar, enquanto olhava a prateleira.
Não te fui eu buscar porque quis provar a mim mesma a minha teoria: eras mais um livro naquela estante, entre tantas da livraria.
Eu peguei-te e levei-te até casa.


Até logo, quando me embalares...


Borrega

junho 25, 2009

Cartas a Florbela - carta III

Flor há muito que te queria escrever esta carta que, e acabei de decidir agora, será a última.
Quando te quis escrever, no sábado, dia 1, eu estava feliz e tu sabe-lo bem. Fui ver-te e estava com ele. Aqueles braços que me envolviam a cintura enquanto te lia são os que, muitas vezes, me amparam quando vou, e pior, quando quero cair.
É estranho ler teus versos doloridos quando aqueles braços quentes me envolvem. As minhas mãos estavam frias por te pegar, por sentir a dor de cada verso teu, por percebê-la, por, instintivamente, torná-la minha. Mas, desta vez, tua dor não abalou cada centímetro do meu corpo, porque seria traí-lo, seria trair o corpo que me abraçava deixar que isso acontecesse.
Ele não me quer ver chorar, carpir, sofrer, morrer. Diz que tenho de evitar tudo o que não é necessário. E assim, os braços quentes não me deixaram sussurrar-te como de costume, com aquela amargura que me vem das mágoas que tenho e que me adoça a boca. Naquele momento, não queria chorar.
Desde essa tarde os meus humores andaram em montanha russa, de loopings bem pronunciados. Amarguei, andei apática, recalquei crise de choro atrás de crise de choro. Fui magoada, senti o peso da culpa, que impus a mim mesma, por magoar quem me magoou, perdoei, sorri, fui traída por umas quantas lágrimas e recalquei nova crise de choro, até que, por fim, chorei, chorei e continuei a chorar.
Estou farta de ser eu, estou farta de chorar, estou farta desta instabilidade que me está inerente. Como aguentavas?
Fui a casa, tudo na mesma. Pergunto-me se me faz mais bem que mal lá voltar... Estou de volta a Vila, volto a recalcar a vontade inexplicável que tenho de chorar.
Flor, esta é a última carta que te escrevo. Vou tirar-te daquela estante, vais deixar de ser mais um livro, vais passar a ser o livro na minha cabeceira, vão ser teus versos a embalar-me o sono.

Até já...


Borrega

junho 24, 2009

Needs

As mãos trémulas pegam no bule e vertem o seu conteúdo fumegante numa bonita chávena branca. Adoça-o, tem pressa em bebê-lo, em sentir o calor a percorrer-lhe o esófago. Aquele chá de camomila é a sua esperança de aquecer o corpo e a alma.
Sente uma necessidade intolerável por calor, sentir o calor de alguém. Necessita daqueles abraços protectores, de adormecer assim, enlaçada num porto seguro, num porto quente.
Todos os dias, sente aquele calafrio e aquela vontade inexplicável de ser abraçada, aquecida...





Um dia fujo para o fim do mundo...
Aí dou um abraço a qualquer desconhecido...
Aquele abraço que necessito dar...
(adaptação de "Carta de um Marginal")
Borrega
Créditos:
Quadro: Gustav Klimt

Cartas a Florbela - carta II

Hoje estive contigo, vi-te, toquei-te. Acho que também me viste, pelo menos naqueles momentos em que estive contigo nada escondi, nada recalquei.
Florbela, lembraste que te disse que queria chorar? Naquele dia não chorei! Não estavas lá, mas não chorei, alguém me amparou.
Hoje, Flor, entrei, olhei, andei para ti, não corri, nem tu, nem eu temos que expressar a nossa ânsia assim, ela fica tatuada em papel. Peguei-te nas minhas mãos, estavas diferente, a capa, a textura, o tamanho, no entanto eras tu, soube mal te li. Aquelas palavras que, apesar de já passar algum tempo, ainda sei quase de cor. Li-te de olhos semi-fechados, aplaquei a alma.
Naquele dia não chorei, recalquei e tranquei cá dentro as lágrimas que, por motivo nenhum, queria derramar. Sei que não o devia ter feito, não é bom para o corpo e, sobretudo, não é bom para a minha alma. Pensei em todos os momentos em que chorei desalmadamente, como queria fazer naquela altura, e empurrei essas lágrimas para lá. Reneguei-as e, cada vez que elas voltam, torno a recusá-las o mais que posso.
Quando te vi, eras mais uma, numa prateleira, etiquetaram-te e rotularam-te com um preço. Hoje é assim. Não tenho o que pedem por ti, por isso volto a colocar-te entre as outras duas lombadas que te aconchegavam, para que, quando me for, sejas outra vez mais uma numa estante.
Vou voltar para te ver, para me acalmar com aqueles teus devaneios em estrofes expressados. Vou, de olhos semi-fechados, sussurrar-te e vais deixar de ser mais uma numa estante.
Hoje também quero chorar, mas não o vou fazer. Estiveste comigo e, agora, vou abraçar aqueles que sempre me amparam.
Até breve, obrigada…

Borrega

junho 23, 2009

Cartas a Florbela - carta I

Instável, cada vez mais é assim o meu estado emocional. Eu estou, acima de tudo, feliz, feliz como há muito não estava. Muita coisa contribui para isso, muita coisa que não me quero perder a mencionar.
Estou na aula de Antropossociologia, é uma aula de que gosto, a maneira como o professor expõe a matéria e responde às nossas dúvidas e palpites é inflamada, muito engraçada. No entanto, não estou cá!
À minha frente está o “Bruno”, o rotweiller de peluche da Dra. Raquel, e o professor. Há uma hora eu estava feliz, era só risos e brincadeiras, mas, tal como de repente começou a chover, também os meus olhos murcharam, apagaram.
Estou a voltar ao mesmo e agora já não te tenho comigo, para te ler, já não estás na minha cabeceira, tu em teus poemas instáveis de quem vive e quer morrer, de quem é instável como eu.
Estou tão apagada que já me comparo a ti. Tu eras a “charneca em flor”, por quem as estações passavam num rodopio louco, que nem a morte fez cessar. Eu não sou nada!
Florbela, quero ler os teus poemas quando chorar! Poetiza e mulher, tu que amaste a morte ao ponto louco de escolheres tu, tu e não Deus, o dia em que te juntarias a ela, são tuas palavras que quero ler quando chorar noite dentro, são teus devaneios que quero ter como pano de fundo para os meus.
Estou a escrever a uma morta (tu estás morta e, no entanto, vives nas bocas de todos os que te lêem), numa aula à qual eu devia estar atenta. Estarei louca? Serão estas mudanças de humor, estes olhos murchos em corpo alegre, apenas a confirmação de que o meu lugar é numa ala do manicómio e não aqui?
Que se lixe a resposta! Não me interessa, o que quero agora é ouvir-te.
Estou na aula de Antropossociologia e acabei de te escrever, sei que não podes ler esta carta, estás morta: o destino impeliu-te, brutalmente, para aí.


Borrega

Saltimbanco

"Um pouco mais de sol - eu era brasa,
Um pouco mais de azul - eu era além.
Para atingir, faltou-me um golpe de asa...
Se ao menos eu permanecesse aquém..."





Daquele banco, no meio do verde, em terras de Aleu, ela imagina aquele outro banco, numa simples varanda de uma casa, que nem bem de sua pode chamar.
Nesse banco, ela é banhada pelos tons laranjas do poente, que vão descendo sobre as searas, doirando o milho e enterrando-se nos montes distantes. Vê as garças em alvas paradas, rompendo as nuvens tingidas de tarde, tingidas de rosa. Olhos no horizonte, perdidos, divagantes, sonhadores, utópicos como sempre...
Ela fecha os olhos e viaja de novo. Outro banco, outro sitio, ainda mais distante de onde está. A planície alentejana, findando em falésias escarpadas, eruditas pelo tempo, banhadas pelas ondas salgadas. O mergulho lento do sol, por entre as águas ondulantes. Ela, mais petiz, mais inocente, mais enérgica, olha o pôr-do-sol, respira a maresia, envolta no canto das gaivotas.
Abre os olhos, covas roxas, cavadas pelo cansaço de noites mal dormidas, atormentadas por quimeras das coisas perdidas, e lá está o Corgo a correr à sua frente. O sol a pôr-se lá longe.
Queria agarrá-lo, tê-lo na palma da mão. Queria ser incêndio, já só é brasa...


"Roendo uma laranja na falésia
Olhando o mundo azul à minha frente,
Ouvindo um rouxinol na redondeza,
No calmo improviso do poente"



Borrega


Créditos:
Foto: banco em Porto Côvo
Música: Rui Veloso - "Porto Côvo"
Poema: Mário Sá Carneiro - "Quase"

junho 22, 2009

Faltas


Agarrou-a pela cintura. O braço dela envolvia-o também. Olhou para ela, sorrindo. Ela largou-se em gargalhadas, enquanto ele a suportava para não cair. Todo o grupo se riu.
Endireitou-se e apertou-o de lado. Ele continuava ali. Estava a arrefecer. Ele apertou-a. Sim, ela estava ali, de cabeça encostada ao ombro dele tentando roubar-lhe calor. Ela continuava ali, debaixo do guarda-chuva, protegida por ele. O grupo que ficara para trás era apenas um pequeno grito nas consciências.
Pararam. Ela passou o dedo pelos lábios, estes abriram-se, enquanto ele sorria para ela. Ela pôs-se em bicos dos pés. Ele baixou a cabeça. Agarrou-a e pegou-lhe ao colo. De pernas entrelaçadas, ela encostou a cabeça e sorriu-lhe. Ele murmurou-lhe algo ao ouvido, ela ergueu a cabeça. Encostou os lábios nos dela. O grupo aproximou-se sorrateiramente.
Ele pô-la no chão. Colocou-lhe as mãos à volta da cintura. Ela acomodou a cabeça no peito dele. Conversas sobre nada, reparando em tudo, fazia o grupo soltar gargalhadas.
O sono começou a abatê-lo. Ela deu-lhe a mão. Ele entrelaçou os seus dedos nos dela. Sorriram para o grupo. Estes entenderam, de modo muito subtil estavam-se a despedir.
Ficaram a vê-los afastarem-se, como ele a tentava proteger, como ela fingia ser fraca para precisar da protecção dele, como a intimidade, a silenciosa intimidade aumentava a cada passo.
A brisa refrescou-lhes os rostos, gritando os murmúrios do jovem casal.

'Faltas-me'
'É... Fazes-me mesmo falta..'


Pulga

junho 21, 2009

Nostalgia

A lua já vai alta e cheia no céu, quando para ali foi ainda faltava para o sol se pôr. Como não deu pelo passar do tempo? O terraço é agora apenas banhado pela luz das estrelas que dançam em torno da lua e começa a ser difícil ler. Num suspiro fecha o livro e dispara para a noite:
- Sinto saudades, tantas que chega a parecer que vou rebentar. Afogo-me em memórias perfeitas dos momentos ideais que vive, não dos que estão a acontecer. Já nada sabe tão bem como antes, já nada é o antes. - Lamenta-se.
- O antes não volta, pára de remoer nisso, pára de idealizar o que poderia ser agora se não tivesse acabado. - Retribui-lhe a Consciência - Sabes bem que a vida é um fluxo unidireccional, o que já foi, lá vai. Pára de te alimentar das memórias, antes que comeces a definhar na amargura que te tomará a alma.
- Eu sei. Desculpa... Mas não é só isso que sinto. Sinto-me confusa, que é suposto eu fazer, que é suposto eu sentir?
- Oriana, não sejas tola. Não é suposto sentires, não há pré-definições, sente-se e pronto! Sê apenas a criança alegre, exuberante e impetuosa que sempre foste. Quanto a estares confusa, leva com calma. Respira, sente aos poucos as coisas, disseca-as para as perceberes, mas também não dês em doida a pensar nelas. Ri, vive, convive!
- Obrigada! - sorri-lhe a menina-mulher.

Oriana…

Borrega

junho 20, 2009

Melancolia da Alma

Sob a mesa está um cálice de um âmbar doce, até demasiado doce, que se vai diluindo e clareando com o derreter das pedras de gelo.
Olha a noite, olha o céu negro. Eles contemplam-lhe a alma melancólica, a dor lancinante que lhe turva os olhos. Leva o cálice aos lábios, espera que lhe aqueça a alma.
É agridoce por natureza, a melancolia está-lhe nos genes, faz parte da sua aura natural, mas ultimamente adensou-se, tornou-se demasiado carregada. Aquela bebida âmbar, aquele licor de cor tão doce e quente é a sua tentativa de diluir o excesso de amargura. É o gelo do seu corpo.
Sente a brisa no rosto, balançando-lhe o cabelo, soltando aquele seu aroma agridoce pelo ar.
Pega no cálice e dá-lhe o trago final.


Borrega

junho 19, 2009

Olhos cegos no Tejo...


"And you
Can bring me to my knees
Yeah"


Parou com o choque. Era aquela música a ressoar-lhe nos ouvidos, a fazer tremer cada célula do seu corpo e, em frente de si, erguiam-se aquelas escadas. Ironia pura!
Sentou-se nos seus degraus, nos degraus deles… Os óculos de sol escondiam a nascente, mas não tardou a que as lágrimas lhe escorressem pela cara, misturando-se com o suor da caminhada. Ali ficou, dorida, cansada, largada, a sentir-se, mais uma vez, esmagada pela saudade, pelo tempo, pela ausência, pela ferida ensanguentada que era o seu coração.
Contudo era melhor tudo isso, toda aquela dor e vazio, que nunca ter sido, que nunca ter sentido aquele fogo, aquele incêndio. Mesmo que soubesse que, a partir de agora, só teria fogueiras e brasas, era melhor assim e sabia-o. Ergueu-se, acariciou o degrau, levou os dedos ao peito. Foi para casa, riu com a sua Bonequinha, saiu para estudar com ela num café.
Mas hoje nada está bem, hoje não se sente bem, tem a alma inquieta, a querer sair do corpo, a querer correr para longe. Então sai do café e vai sentar-se ao sol, fecha os olhos e deixa-a ver o sítio onde quer estar e a alma diz-lhe:
- Oriana, vê como é bonito, como nós ficaríamos bem.
- Sós, apenas nós, hectares de milho verdejante e o Tejo, com as suas águas matreiras… - Completa-a num suspiro.
- O vento do fim de tarde assobiando e fazendo dançar as searas, o pó correndo em remoinhos, a pegar na tua pele suada, a sujar-te o corpo cansado… - Prossegue a alma.
- A volta para casa, o banho gelado de mangueira e, depois, cair exausta na cama, mas em paz. - Findou Oriana
- Era só isso que queria, dói-me tanto Oriana. Dói-nos tanto… - Desabafa.
- O Tejo, o milho, o fim de tarde doirado pelo poente, o vento na pele a dizer-nos que tudo avança, a esperança de que passe a dor a cada brisa… Como tenho saudades do Tejo!
- Oriana, não abras ainda os olhos, deixa-me vê-lo mais um pouco. Depois deixo-te voltar para a Bonequinha, deixo-te estudar. – Sussurra-lhe a alma, numa promessa rogada.
E quem ali passou viu Oriana, ao sol transmontano, numa pedra, de olhos fechados, sentada.

Oriana




Borrega




P.S.- "This is a dedicatory song":
* Bitchinho
~ Quase Gomo
* às tardes e noites no CC e respectiva companhia



Créditos:
Música:
Dream Theater - "I walk beside you"
Staind - "Outside"

Foto:
powerd by BiTcHiNhO*



junho 18, 2009

Corre para ver o parque, corre...
Ele levanta-se e vai buscar papel e caneta.
Ela, pasma, pergunta-lhe o porquê. Ele diz-lhe: "Escreve."

«Passa a ponte, ouve a sinfonia coachada pela noite. Porque raio não dormiu descansada, mesmo de costas estaladas?? Porque não dorme apenas embalada por aquela anfibia sinfonia e insiste no choro?»

E naquela folha, ela desabafou.



Borrega

junho 17, 2009

Sala de Espera

Sorriu.
‘Como estás?’ perguntou-lhe.
‘Que queres dizer com isso?’
‘Eu não sou daquelas pessoas que estou sempre a perguntar…’
Ela iluminou-se. A sua expressão respondeu-lhe mesmo antes que ela pudesse dizer qualquer coisa. Lembrou-se duma das suas caminhadas com outro amigo.
‘Ainda te afecta?’
‘Hã?’
’Isso ainda te afecta?’
‘Há muito tempo que não durmo como deve ser, mas não me afecta da maneira que estás a falar.’
Sorriu. Outra vez.
Passasse o que se passasse, eles conseguiam fazê-la rir. Conseguiam mantê-la animada naquela sala de espera entediante. Faziam com que ela conseguisse enfrentar os problemas na sala seguinte. Mas ela estaria sempre a voltar à sala de espera, só para mais uns risos, mais umas conversas. E era para lá que ela caminhava agora. Para a sala de espera. Más notícias vinham a caminho e ela precisava daquela sala.
Pulga
[P.S.: Foto da minha autoria]

junho 14, 2009

fim de tarde

A relva fumegava pelo cigarro que ele acabava de atirar para longe da mesa onde estavam. Um de muitos que fuma por dia…

Tem o olhar no vago, enquanto ouve (?) música no mp3. Ela não está melhor, ouve, pela enésima vez, aquele álbum dos U2 a passar nas colunas do café, tentando mergulhar nas páginas do seu livro. Mas é como lhe disse uma vez, não há botão para desligar e a sua cabeça, tal como deduz da dele, está a mil.





Borrega

junho 12, 2009

Barracão puído

Olha o velho barracão, está puído pelo tempo.
Sente aquele toque na mão. Sabe bem o que é, então tira da mala o Black Devil que ele lhe deu.
Está meio gasto por tantas horas a pensar com ele nas mãos. Mas, mais uma vez, imita o ritual que adquiriu naquele barracão: bate-o contra a palma da mão. As saudades acalmam.
Não mais voltará a ser a criança a quem, naquele barracão, o avô batia o tabaco na palma da mão, para depois ir fumá-lo longe dela.
Já não é aquela menina. Volta para casa, espera-a uma longa busca pela cabeça que perdeu. Esperemos que o Black Devil dure…






Borrega


junho 11, 2009

Sentada

E sentada, sozinha, no meio do jardim, acompanhada apenas pelo som murmurado do rio e a brisa do fim de tarde, ela finalmente chorou...
Tem medo, tem saudades, tem a cabeça numa bagunça, tem o corpo num desgasto só... Parece um farrapo e, ainda assim, insiste em caminhar. Não mudou assim tanto que tenha adquirido a coragem ou cobardia suficiente para desistir....
Tem gente que a faz sentir gente e começa a conseguir andar mais equilibrada com apenas três pernas.
Isso não implica que não sinta a perda da quarta, sentir-lhe-á sempre a falta, mas a dor no seu membro fantasma já amainou.

E sentada no jardim, sozinha, ela chorou!



Borrega



Nota: gostei da imagem, tem milho! Como ribatejana que sou e estando emigrada em Trás-os-montes, tenho saudades do milho!!!!!

cinzas

O cheiro a queimado e o fumo negro iam povoando o ar. Ela olhava o fogo e os lençóis a contorcerem-se por entre as impiedosas chamas.
As labaredas iam esmorecendo e, com receio que se extinguissem, ela deitou mais álcool nos lençóis. Tinham de arder até não passarem de cinzas, tinham de desaparecer.
Oriana tinha a noção do quão louco era aquele acto, mas precisava dele para purgar a alma. Aqueles lençóis não tinham culpa de cheirarem como ele, de, apesar de nunca terem envolvido o corpo dele, cheirarem à sua pele alva, ao corpo porque ela ansiava o retorno.
Tal como é costume às quartas-feiras, tinha feito a cama de lavado. Contudo, quando se deitara e se aconchegara nos lençóis, o cheiro dele estava lá. Levantou-se frenética, arrancou-os da cama, espezinhou-os lavada em lágrimas e em gritos doloridos. Depois acabou por adormecer num sono revolto por cima do colchão desnudo. Mal acordou, pegou neles e foi queimá-los.
E agora aqui está a vê-los arder e não se sente melhor, apenas mais louca! O lume abranda, extingue e ficam as cinzas. Está impregnada com o cheiro do fumo, mas ainda distingue o cheiro dele na sua pele, na sua memória.
- Merda! - resmunga entre dentes. - Achaste mesmo que o reduzirias a cinzas como aos estúpidos dos lençóis? Parva! Nunca ficarás sem ele, é parte de ti, do que foste, do que te tornaste. Mudou o que serás. Limita-te a sobreviver! Ignora o perfume doce que reduziu o teu amargo aroma. Aprende a estar bem! – auto-repreende-se.
- Esquece esta infantilidade e vai tomar banho. – roga-lhe a Consciência.
Voltando costas às cinzas, Oriana corre para debaixo do chuveiro, para lavar a vergonha que sente de si, das cinzas que ainda é! Quando renascerá a Fénix????

Oriana…




Borrega

junho 10, 2009

"I cry when angels deserve to die" (5/4/05-9/6/09)


Está sol, sol é dizer pouco, está uma brasa.
Um homem, em tronco nu, cava um buraco, perto do outro que cavou anos antes. Tal como anos antes, está triste, perdeu um amigo. Cada vez que o buraco vai ficando mais fundo, mais lhe dói, mais sente a tristeza da menina que, lá em casa, chora por aquela partida.
O homem sua, está cansado, mas não pára até ter feito a cova. Olha agora para o lado, está lá o seu pequeno índio à espera, calmo e sereno. Morreu feliz, teve uma vida cheia. Continua a ter aquele ar doce, que nem o fel do luto lhe lavou da cara.
Pega-o como a um filho, e deposita-o no fundo do buraco. Ele há-de gostar de repousar ali, está ao lado da sua mãe.
O homem é ateu, o homem não acredita, contudo, tal como pela mãe, faz a reza por aquilo que acredita, pelo carinho que lhes tem, pelos passeios pelo campo, pelos sorrisos ao vê-los correr atrás dos coelhos, dos ouriços e das cobras. Ele reza e a menina chora. Ele está encharcado em suor e ela em lágrimas. Ele volta para casa e ela sai de lá e vai correr pelo campo, onde antes corria com ele, o seu índio de olhos de mel...

Sioux...

«Indian, indian, why did you die for? Indian say: "nothing at all."»
Jim Morrison


Borrega


Créditos:
titulo: trecho da música "Chop Suey", Sistem Of A Down

junho 07, 2009

noites de Oriana

O corpo, apesar do seu quê de franzino, já não é de menina. Contudo, o rosto mantém-se pueril e nesta noite, como em outras, atormentado.
Oriana dorme abraçando algo que parece muitíssimo importante.
(...)
As torradas e as canecas de leite são banhadas sobre a mesa pelos raios tímidos que rompem por entre as nuvens. Ouvia remexer-se na cama toda a noite, mas sem nunca largar o que quer que fosse que pensava abraçar.
Acordei-a o mais meigamente possivel, pedira-me que não a deixasse dormir até muito tarde, tinha de estudar.
Abriu os olhos, meio perdida e, de imediato, olhou para os braços nus e sós. Não tive de lhe perguntar, ela entreviu a curiosidade nos meus olhos e pediu que lhe chegasse o computador. Enquanto esse ligava disse:
- É algo um pouco digno de dó. - diz corada...
- Não tens de contar, estou curiosa, mas não tens de o fazer.
Está já demasiado absorvida no que procura na net para me responder, sei que quando o fizer será com a sua explicação.
Após um suspiro meio dorido, diz:
- Lembraste do filme Notting Hill, certo?
Aceno afirmativamente.
- O que te vou ler é um diálogo entre as personagens principais:
«- Rita Hayworth used to say, "They go to bed with Gilda; they wake up with me."
- Who's Gilda?
- Her most famous part. Men went to bed with the dream; they didn't like it when they would wake up with the reality.»
Eu todas as noites adormeço a abraçar a minha pequena esfera de eternidade, nela estão todos os momentos mais felizes, e todos os dias acordo sem nada.
Escorre-lhe já uma lágrima matreira pela face extremamente corada pela revelação. Abraço-a.
- Oriana, não é deprimente, não tens de ter vergonha. E os momentos continuam lá, só acordas sem eles porque é a forma que eles têm de te mostrar que tens de seguir em frente.


Oriana...


Borrega
("rapariga, move on!")

Créditos:
Filme: Notting Hill

infância (alva aurora da existência)

Entrou no quarto, vinha enfurecida, coisas típicas de quem está na terrível fase das incertezas e descobertas... As paredes estavam “salpicadas” com posters, calendários, poemas, citações... Largou a mala e começou a arrancá-los, um a um, sem os danificar, pois, no fundo, eram pedaços de si, mas ansiava, desesperadamente, ver de novo as alvas paredes nuas, como ela estava quando era apenas feto, refugiado no aconchego protector do útero de sua mãe. Depois de alguns minutos de puro frenesim, lá estavam elas, límpidas e alvas, como a mente de uma criança, tão ingénuas.
Fechou então a pequena caixa florida onde tinha colocado tudo o que antes forrava as barreiras do seu mundo. Respirou fundo e dirigiu-se à cómoda, onde fez arder o incenso, que tanto a acalmava. Pôs a tocar aquela música, a daquele poeta marginal de voz eterna, que tem por fundo uma copiosa tempestade e deitou-se no tapete, onde gostava de se estirar para reflectir e divagar. Observou a panorâmica nevada da divisão, fechando os olhos logo de seguida.
Ela não tinha pedido para estar ali, não tinha pedido para ser arrancada do útero que a carregava, mas tinha pedido para crescer, para ser grande e percebia agora que, tal como lhe tinham dito, queria voltar a ser pequena. No entanto, o tempo não podia voltar a atrás. Sentia falta de ser pegada no colo e mimada, sentia falta das história antes de adormecer, sentia falta de quando achava que cair e esfolar um joelho era o pior mal que podia existir, sentia falta de quando achava que o mundo não tinha fim, sentia falta da pura ignorância, da ingénua criança que fora outrora... Queria tanto voltar a ser pequena!
A alva aurora da sua existência tinha sida tão calma, de uma doçura tão branda... Actualmente debatia-se para conseguir sobreviver no complicado mundo dos adultos, todo ele cheio “números, raízes quadradas e somas subtraídas, sempre com a mesma solução: nada”. Essa é a verdade, à medida que crescemos as responsabilidades, pressões e preocupações são tantas que começamos a não ter nada. Enquanto que, naquele tempo cândido e alegre temos a eterna novidade do mundo, uma curiosidade insaciável que nos povoa o imaginário com a ajuda, é claro, duma fértil imaginação e das maravilhosas histórias ouvidas. O mundo seria tão melhor se, ao crescermos, não matássemos a criança que temos em nós... Tudo seria mais simples, mais claro, tão menos malicioso...
Abriu os olhos, o quarto estava um pouco enevoado, devido ao incenso que se ia desfazendo em cinzas, tal qual o Homem que vai do ouro e se deixa corromper pelas chamas duma sociedade com princípios decadentes, acabando num pedaço de metal enferrujado e só.

Borrega


P.S.- to my Honey (bitchinho)

Créditos:
Músicas: The Doors - "Riders on the storm"
Toranja - "Carta"

junho 06, 2009

in memory...

Não te queria, não te gostava, não te amava. Já te disse que não te amava? Mas mesmo assim nada pude fazer contra ti e tu foste ficando.
Cresceste tanto, livre por entre as ervas, saltavas, pulavas.
Rorronaste no meu colo, procuraste o meu abraço, vinhas para te roçares nas minhas pernas mesmo quando não era bom para ti. (acho que o Apache não te queria lá!!!)
E é assim que te lembro, encostado às minhas pernas...


'Mikasi, tenho saudades...

Borrega
Créditos:
imagem: Kurt Cobain

junho 05, 2009

Finais felizes


Olha pela janela. O tempo não agoira nada de bom. Mas ela acredita que ele virá, não montado num cavalo branco, nem de árvore em árvore, mas ele virá.
Enquanto ele não vem, ela está com o seu livro no regaço, o vento muda-lhe as páginas, abrindo na última página:
‘E viveram felizes para sempre.’
Riu-se. Aquilo sim dava para umas boas gargalhadas. Os risos esfumaram-se em memórias…
A campainha fê-la despertar.
Demoraste’ disse enquanto se aninhava nele.
Desculpa’ sussurrou-lhe enquanto a envolvia nos braços.
[Era este o agora que precisava e não um final para sempre, feliz ou não.]


Pulga

Sigh...

Inspiração... Distracção... Divagação... Tudo me corre pelo pensamento menos o que devia: os slides de anatomia que devia estar a estudar.
Apetece-me gritar, rir, correr livre pelos campos que estão, lá ao longe, nas traseiras da minha casa.
Apetece-me um bom livro, um bom filme, um bom café à lareira, uma boa noite de sono. Apetece-me um bom jantar no italiano, apetece-me sentir a cabeça de alguém a repousar no meu regaço, enquanto os meus dedos se enredam pelos seus cabelos.
Apetece-me viver, correr contra a corrente, cair, esfolar-me, levantar-me e tornar a correr engolindo as lágrimas que, entretanto me caem pela cara sempre de pirralha.

Apetece-me...

Apetece-me...

Apetece-me...
Borrega
p.s.- apetece-me, mas vou engolir essa vontade e voltar pa anatomia...
ahh, and this is kind of dedicatory...

Uma tarde de Verão...

Sentadas num café, elas estudam, quer dizer tentam, ou melhor fingem...
Estão como o tempo. Olha-se pela janela e veêm-se as caracteristicas nuvens de Verão, quase negras de tão cinzas e o gélido vento cortando as folhas e fazendo-as elevarem-se em perdidas danças aéreas.
Ironia e sarcasmos à parte, elas são mesmo esquisitas, falam por citações e letras de músicas, riem que nem tolas para depois chorarem que nem madalenas. Vivem diferente, vivem à frente... Pobres iludidas! Hão-de penar tanto, hão-de vergar tanto sob a vardasca madrasta da vida e, se ainda se tiverem uma à outra, hão-de erguer-se e sorrir-lhe.





Borrega
P.S.- Vai ficar tudo bem...

junho 03, 2009

Espera

‘Prometeste que ia passar. Tu prometeste.’
‘Eu sei. Eu sei que vai.’
‘Mas ainda não passou!’
‘Não tens ainda a consciência pesada?’
‘Talvez. Mas não falam comigo…’
‘… E descarregas em cima de mim?’
‘Desculpa.’

Caiu-lhe nos braços. Ele afagava-lhe a cabeça como um irmão. Ela continha as lágrimas. Não, não iria chorar ao colo dele. Não dele.
Ele murmurava-lhe. Não havia risos. Não havia conversas sobre nada. Era uma conversa séria.
‘Quando quebras os princípios. Não és tu. Dói. É difícil de recuperar. Mas recuperas. Tu tens princípios. Por muito mal que ele tenha feito, tu sabes que lhe tens de contar.’
‘Eu sei.’
Soluçou-lhe.
Apertou-a de lado. Levantou-a. ‘Anda.’ Disse-lhe na sua voz rouca. ‘Consegues, não consegues?’
‘Sim. Claro que sim.’
‘Então de que te queixas? Tens tudo o que precisas. Porque insistes naquilo que não tens e te está distante?’
‘Não sei. Não sei. As minhas certezas à muito que se desvaneceram. As coisas mudaram, avançaram, e eu continuo ali, onde tudo era feliz, mas já não o sou. Avançaram e eu fiquei parada e agora… Agora acho que já não apanho o ritmo… Achas que ele abrandará para me levar?’
Ela atrasou. Ele deu mais uns passos e parou. Ali estava a sua resposta. Era nas pequenas coisas que ele fazia, nos movimentos lentos, nas palavras soltas vividas que ela encontrava as respostas nele. E tal como ele, o tempo esperaria por ela.


Pulga

junho 02, 2009

Encontro na rua

E, nesta rua cheia de gente, caminho.
E, nesta rua cheia de gente, todos vão para algum lado, todos caminham para alguém e eu? Eu vou para quem?
Aí está, não vou para ninguém, deambulo sem parar, deambulo até te encontrar. Foste tu que, mais uma vez, me encontraste, és sempre tu que me encontras.
Abraçaste-me, depositaste-me um beijo na cabeça e eu voltei a querer andar.
Continuo a amar-te, vou amar-te sempre. Foste o primeiro, contudo ontem fiquei feliz apenas porque senti o meu melhor amigo de volta... Isso é tudo o que quero.




I Walk Beside You

Obrigado!




Borrega

Deitada no egoísmo

O cobertor verde, sobre o manto não menos verdejante do jardim, serve de aconchego à jovem nele deitada.
Ar distante, pensativo, de macambúzia introspecção… Ouvem-se-lhe os pensamentos nos olhos castanhos:
- E os teus ideais utópicos? E a fome no mundo? – atira-lhe a Consciência.
- E a fome da minha alma? Quem me a mata, quem me a estanca? – arremessa-lhe egoticamente a jovem.
- Oriana… - geme-lhe maternal a Consciência.
- Deixa estar! Deixa sangrar! – grita de forma acesa.

“Oriana…”

Borrega
Créditos:
Música: Beatles - "Let it be"
The Rolling Stones - "Let it bleed"